A Reforma da Previdência é o assunto do momento neste ano de 2019. Apresentada em fevereiro, a Proposta de Emenda Constitucional nº6/2019 (PEC 6) do governo federal acabou de ser aprovada na Câmara dos Deputados em 2 turnos. Ou seja, agora está nas mãos dos senadores que podem aprová-la, mudá-la e até rejeitá-la. E nós servidores, com nossa mobilização, podemos influenciar o resultado desse processo ainda em andamento, restando toda tramitação no Senado Federal, a casa revisora.

No seu conjunto, a imprensa vem noticiando o assunto de maneira incompleta e parcial. Em geral, apoia a proposta do governo. Para suprir a carência de informação completa e objetiva, esta cartilha fornece uma visão geral da PEC 6, que afeta os servidores e suas famílias, bem como todos os trabalhadores brasileiros.

Sem negar que os sistemas de previdência possam sofrer ajustes, de tempos em tempos, principalmente em razão das mudanças econômicas, sociais e populacionais, avaliamos que a PEC 6 está equivocada, pois compromete a própria missão da Previdência, ao enfraquecer a proteção do trabalhador sem condições de sustento por meio da atividade laboral.

Com efeito, a PEC 6 atinge duramente os servidores federais de todas as gerações. Os que estão na ativa terão que trabalhar muito mais tempo para conseguir uma aposentadoria achatada, de forma que o provento da maioria não alcançará nem mesmo o teto do INSS. Os já aposentados perderão uma parte considerável dos seus atuais rendimentos. E as famílias que dependerem de pensões por morte terão quedas dramáticas em seus padrões de vida.

Atualmente, o/a servidor/a público/a se aposenta segundo as seguintes regras:

1º grupo: Quem ingressou no serviço público até 31/12/2003
Faz jus à aposentadoria cujo valor inicial é igual à última remuneração como servidor ativo (integralidade) e reajustado da mesma forma da remuneração dos servidores em atividade (paridade), desde que preencha cumulativamente os seguintes requisitos:

– 30 e 35 anos de contribuição para mulher e homem, respectivamente;
– idade mínima de 55 e 60 anos para mulher e homem, respectivamente;
– 20 anos de efetivo serviço público. Quem tiver completado 10 anos (e não 20), poderá se aposentar no RPPS da União, mas sem integralidade e paridade;
– 5 anos no cargo.

2º grupo: Quem assumiu o cargo entre 01/01/2004 e 03/02/2013
Obtém uma aposentadoria com valor inicial igual à média das 80% maiores remunerações do período contributivo. Em seguida, o provento terá o mesmo reajuste das aposentadorias do INSS. As condições para a concessões são as seguintes:

– 30 e 35 anos de contribuição para mulher e homem, respectivamente;
– idade mínima de 55 e 60 anos para mulher e homem, respectivamente;
– 10 anos de efetivo serviço público.

3º grupo: Quem ingressou a partir de 04/02/2013
Tem a aposentadoria calculada igual ao 2º grupo, mas limitada ao teto do RGPS (hoje R$ 5.839,45). Em contrapartida, enquanto estiver em atividade, o servidor também contribuirá sobre a remuneração mensal limitada ao mesmo teto.

Pertencem ao 3º grupo também os servidores que tomaram posse no cargo antes de 04/02/2013 e que sucessivamente “migraram” para o novo regime, ou seja, formalizaram a opção de ter suas contribuições e benefícios calculados como se tivessem ingressado depois de 03/02/2013. O servidor “migrado” receberá também um benefício especial do RPPS, quando de sua aposentadoria, para compensar eventuais contribuições realizadas antes da “migração” e que incidiram sobre uma remuneração maior do que o teto do INSS.

Os servidores do 3º grupo fazem jus à contribuição patronal, em contrapartida às suas próprias contribuições, quando aderirem ao Regime de Previdência Complementar (RPC), uma previdência privada administrada pela Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal do Poder Executivo (FUNPRESP-EXE). Os demais servidores podem aderir ao RPC, mas sem receber a contribuição patronal.

COMO VAI FICAR
A PEC 6 altera os pré-requisitos para a concessão da aposentadoria de todos os servidores, inclusive de quem ingressou no serviço público federal antes da aprovação desta reforma. Por isso, as novas exigências formam a “nova regra geral” que, em parte, será disposta em lei complementar ou ordinária e não mais na Constituição Federal.

Essa possibilidade de desconstitucionalização de itens importantes do RPPS e do RGPS pode causar mais prejuízos aos servidores e aos trabalhadores privados no decorrer dos próximos anos. Um dos riscos possíveis para os servidores é a interpretação do termo “remuneração” se ater, por exemplo, apenas ao Vencimento Básico (VB), o que prejudicaria as carreiras que têm gratificações associadas a desempenho, qualificação, titulação etc. Mesmo sendo de caráter permanente, essas gratificações poderão ser desconsideradas no cálculo do benefício previdenciário por força de futuras normas infraconstitucionais.

A Nova Regra Geral
De acordo como o art. 1º da PEC, o acesso à aposentadoria voluntária será condicionado ao cumprimento cumulativo dos seguintes requisitos:

– idade mínima de 62 anos para a mulher e de 65 para o homem;
– tempo mínimo de contribuição, de efetivo exercício no serviço público e de cargo efetivo, conforme será estabelecido em futura lei complementar da União.

E, por força do art. 26 da PEC 6, enquanto não houver nova lei, o valor inicial da aposentadoria corresponderá a 60% da média aritmética simples de todos os salários-de-contribuição (ou seja, das remunerações sobre as quais incidiram as contribuições do servidor, seja no RPPS da União, no regime próprio de outro ente ou no INSS), relativos ao período contributivo que inicia em julho de 1994 (ou no mês da primeira contribuição, se posterior).

Para o servidor federal (tanto homem quanto mulher), o percentual de 60% sofrerá um acréscimo de 2 pontos percentuais para cada ano de contribuição que exceder os 20 anos, até o máximo de 100%, atingido após 40 anos de contribuição.

Aos servidores atualmente em atividade é facultado valer-se também de regras específicas, chamadas de “regras de transição” que, em tese, são menos duras do que a “nova regra geral” para o servidor federal já em atividade na data da promulgação da emenda constitucional. Na PEC 6, contudo, tais regras facilitam a aposentadoria voluntária apenas para quem hoje estiver a cerca de cinco anos, ou menos, de poder requerê-la. Por exemplo, a “nova regra geral” é mais benéfica para um servidor com 42 anos de idade do que qualquer regra de transição.

Quem já tem direito adquirido? Quem não será alcançado pelas novas regras de transição?
A “nova regra geral” e as “regras de transição” da PEC 6 não serão aplicadas ao servidor aposentado que tem direito adquirido e ao servidor em atividade que, na data da publicação da emenda constitucional, já tiver preenchido todos os requisitos da legislação atual para obter a aposentadoria voluntária, mesmo que não a tenha requerido. Ou seja, também o servidor elegível à aposentadoria tem direito adquirido e as novas regras de aposentadoria só o atingirão, caso lhe forem mais favoráveis.

REGRAS DE TRANSIÇÃO

:: 1º Grupo: servidor ingressado até 31/12/2003
De acordo com a PEC 6, o servidor do 1º grupo manterá o direito à integralidade e paridade, desde que cumpra novas exigências, que alteram o disposto em reformas constitucionais anteriores.

Opção 1:

Exigências cumulativas Regra atual  Regra da PEC 6
Tempo de contribuição
(em anos completos)
 30 (mulher) e 35 (homem)  Exigência mantida sem alteração
Idade mínima 
(em anos completos)
55 (mulher) e 60 (homem) 62 (mulher) e 65 (homem)
Tempo de serviço público 20 anos de efetivo exercício Exigência mantida sem alteração
 Tempo de cargo 5 anos no cargo efetivo em que se der a aposentadoria  Exigência mantida sem alteração

 

Opção 2 (pedágio):

Exigências Cumulativas  Regra atual  Regra da PEC 6
Tempo de contribuição (em anos completos) 30 (mulher) e 35 (homem)  Exigência mantida sem alteração
Idade mínima (em anos completos) 55 (mulher) e 60 (homem) 57 (mulher) e 60 (homem)
 Tempo de serviço público 20 anos de efetivo exercício e 5 anos no cargo efetivo em que se der a aposentadoria  Exigência mantida sem alteração
Pedágio:

período de contribuição adicional em relação ao tempo faltante para completar o tempo de contribuição de 30/35 anos (mulher/ homem) na data da publicação da Emenda Constitucional.

 Exigência inexistente  Pedágio de 100%

 

2º e 3º grupos: aposentadoria de todos os servidores que ingressaram a partir de 01/01/2004

De acordo com a PEC 6, para o servidor integrante dos 2º e 3º grupos, as regras de transição dizem respeito tão somente à concessão da aposentadoria voluntária e não ao valor inicial da aposentadoria, que será calculado a partir da “nova regra geral”.

1ª Regra de Transição com Pontuação (art. 4º da PEC 6)

Exigências Cumulativas  Regra atual  Regra da PEC 6
Tempo de contribuição (em anos completos)  30 (mulher) e 35 (homem)  Exigência mantida sem alteração
 Idade mínima (em anos completos)  55 (mulher) e 60 (homem) 56 (mulher) e 61 (homem) p/ quem se aposentar até 31/12/2021

57  (mulher) e 62 (homem) p/ quem se aposentar a partir de 1º/01/2022

Tempo de serviço público 10 anos de efetivo exercício e 5 no cargo 20 anos de efetivo exercício e 5 no cargo
 Pontuação = somatório de idade e tempo de contribuição (calculados em anos, incluindo as frações).   Exigência inexistente 86 pontos (mulher) e 96 pontos (homem), em 2019. A pontuação necessária aumenta de um ponto por ano, a partir de 1º/01/2020, até chegar aos 100 pontos (mulher) e aos 105 pontos (homem).

 

Idades mínimas x pontuação (1ª regra de transição)

  Mulheres Homens
Ano Idade mínima Pontuação mínima Idade mínima Pontuação mínima
2019 56 anos 86 pontos 61 anos 96 pontos
2020 56 anos 87 pontos 61 anos 97 pontos
2021 56 anos 88 pontos 61 anos 98 pontos
2022 57 anos 89 pontos 62 anos 99 pontos
2023 57 anos 90 pontos 62 anos 100 pontos
2024 57 anos 91 pontos 62 anos 101 pontos
2025 57 anos 92 pontos 62 anos 102 pontos
2026 57 anos 93 pontos 62 anos 103 pontos
2027 57 anos 94 pontos 62 anos 104 pontos
2028 57 anos 95 pontos 62 anos 105 pontos
2029 57 anos 96 pontos 62 anos 105 pontos
2030 57 anos 97 pontos 62 anos 105 pontos
2031 57 anos 98 pontos 62 anos 105 pontos
2032 57 anos 99 pontos 62 anos 105 pontos
2033 57 anos 100 pontos 62 anos 105 pontos

 

 2ª Regra de Transição com pedágio (art. 20 da PEC 6)

Exigências cumulativas  Regra atual  Regra da PEC 6
Idade mínima (em anos completos) 55 (mulher) e

60 (homem)

57 (mulher) e

60 (homem)

Tempo de contribuição (em anos completos) 30 (mulher) e

35 (homem)

Exigência mantida sem alteração
 Tempo de serviço público  10 anos de efetivo exercício e 5 no cargo 20 anos de efetivo exercício e 5 no cargo
Pedágio: período de contribuição adicional em relação ao tempo faltante para completar o tempo de contribuição de 30/35 anos (mulher/ homem) na data da publicação da Emenda Constitucional.  Exigência inexistente  Pedágio de 100%

 

Valor da aposentadoria de todos os servidores que ingressaram a partir de 01/01/2004 (2º e 3º grupos)

Todo e qualquer servidor em atividade sem direito à integralidade, seja homem seja mulher, será submetido à “nova regra geral” de cálculo do benefício. Ou seja, não mais terá o benefício inicial igual à média das 80% maiores remunerações ao longo do período contributivo (regra atual).

Lembre-se que a “nova regra geral” prevê a aposentadoria inicial equivalente a 60% da média dos salários-de-contribuição de toda a vida laboral, acrescida de 2 pontos percentuais a cada ano que exceder os 20 anos de contribuição, até atingir o limite de 100% da média dos salários-de-contribuição, após 40 anos de contribuição. Dessa forma, se o servidor tiver 21 anos de contribuição fará jus a 62% da média, se tiver 22 anos de contributos terá direito a 64% da média e assim por diante.

Apenas no âmbito do Regime Geral (RGPS), à mulher é concedida a aposentadoria voluntária de 60% da média dos salários-de-contribuição com 15 anos de contribuição, ou seja, com 5 anos a menos do que o homem. A servidora do RPPS da União não faz jus a tal direito.

A “nova regra geral” provoca dois tipos de perdas no valor da aposentadoria do servidor sem direito à integralidade. A saber:

1ª perda
Ao não poder descartar os 20% menores salários de contribuição (remunerações sobre as quais houve contribuição previdenciária), será utilizada uma “média rebaixada” para o cálculo do benefício;

Exemplo da 1ª perda: ao longo de 20% de sua vida laboral, João contribuiu sobre R$ 998 (o piso previdenciário) e, em seguida, sobre R$ 5.839,45 (o teto do Regime Geral). Não podendo mais descartar os salários-de-contribuição de salário mínimo, João sofrerá uma perda da ordem de 15% do valor inicial da aposentadoria.

2ª perda
Serão considerados apenas os 60% da média dos salários–de-contribuição para o servidor com 20 anos de contribuição, os 62% para quem tiver 21 anos de contributos e assim por diante. Tais novos percentuais também reduzem o benefício inicial. Hoje, considera-se 100% da média aos 30 anos de contribuição da mulher e aos 35 anos do homem.

Exemplo da 2ª perda: o servidor e a servidora não farão mais jus a 100% da média com 35 e 30 anos de contribuição respectivamente. Após a aprovação da PEC 6, a servidora com 30 anos de contributos fará jus à aposentadoria voluntária de 80% da média. E o servidor com 35 anos de contributos à de 90% da média.

Os dois tipos de perda trabalham em conjunto, agravando o prejuízo do servidor.

Alterações constitucionais de impacto geral
Alguns elementos da PEC 6 atingem todos os servidores federais. Não apenas os que se encontram em atividade, mas também os aposentados e pensionistas. Os principais são:

1º. As regras do RPPS da União não estarão mais na Constituição Federal (CF)
Várias regras previdenciárias, hoje estabelecidas na Carta Magna, passarão a ser dispostas em lei complementar ou ordinária, de mais fácil alteração, pois podem ser aprovadas com menos  votos e em tempos mais breves. Assim, possivelmente haverá mudanças normativas mais requentes, o que traz insegurança aos servidores e descrédito à previdência pública.

A PEC 6 traz nova redação do art. 40 da CF, transferindo para a lei ordinária as regras: (a) de concessão das aposentadorias voluntária e por incapacidade permanente para o trabalho e também da pensão por morte; e (b) de cálculo dos proventos de aposentadoria. Eis o perigo de grandes perdas para as carreiras que, além do Vencimento Básico (VB), recebem remuneração variável, como gratificações por desempenho, qualificação ou titulação, e que respondem por parcela significativa (maiores de 50% em muitos casos) da remuneração total dos servidores.

2º. Haverá aumento das alíquotas de contribuição previdenciária
O art. 11 da PEC altera as regras de contribuição do servidor. As atuais contribuições, agora chamadas de “ordinárias”, serão calculadas por meio de alíquotas progressivas “em cascata”, incidentes sobre parcelas da remuneração, de acordo com as faixas de rendimento. Assim, o servidor de remuneração maior contribuirá mais não apenas em valores absolutos, mas também proporcionalmente. É algo parecido com a prática adotada no Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF).

Alíquotas contributivas do servidor no RPPS da União

        (R$)                 Valor inicial Valor final   Alíquota %
Faixa 1 0,01 998,00 7,5%
Faixa 2 998,01 2.000,00 9,0%
Faixa 3 2.000,01 3.000,00 12,0%
Faixa 4 3.000,01 5.839,45 14,0%
Faixa 5 5.839,46 10.000,00 14,5%
Faixa 6 10.000,01 20.000,00 16,5%
Faixa 7 20.000,01 39.000,00 19,0%
Faixa 8 39.000,01 22,0%

Fonte: Cartilha Asibama-DF, Ascema Nacional, Condsef, ARCA, Afipea, Andeps, AsMinC, Assecor, INA e SindGCT